As
causas da guerra
Por
Guy Mettan
(in, "Le Courrier")
A
histeria provocada pelos supostos ataques informáticos russos atingiu
proporções alucinantes nos Estados-Unidos. Como explicar que a primeira
potência mundial, dotada de um orçamento militar dez vezes superior à do seu
rival, e que, sozinho ultrapasse todas as outras potências, seja sensível à
“ameaça” putiniana ao ponto de
colocar o país à beira de uma ataque de nervos institucional, e aumentar ainda
mais o caos mundial? Há uma causa interna, bem entendido, que põe
inesperadamente em cheque a coligação Obama-Mc Cain que se julgava segura de
conservar o poder com Hillary Clinton. Depois da segunda presidência de Bill
Clinton, forjou-se nos Estados-Unidos uma aliança de facto, entre o establishment democrata por um lado, e
os neoconservadores de obediência republicana por outro. O bombardeamento da
Sérvia em 1999 selou esse acordo, que nem as aventuras militares calamitosas de
Bush Jr, nem os desmentidos elegantes, mas sangrentos, de Obama conseguiram por
em causa. Hillary Clinton encarnava a melhor esperança para estes dois campos
continuarem o seu business usual, ou
seja o prosseguimento de uma hegemonia americana fundada sobre o ‘comércio
livre’ sem limites, a abertura das fronteiras e o derrube dos regimes hostis em
nome da democracia e dos “valores” ocidentais, o envolvimento dos media – embedded depois da invasão do Iraque em 2003 – e a mobilização
ilimitada de todos os recursos do soft
power.
Acontece
que a derrota de Hillary veio quebrar este mecanismo bem oleado. Com Trump
tornou-se impossível continuar a conivência estabelecida, não obstante as
conferências chorudamente pagas pela Wall Street, a venda de armas e de bombas
aos aliados subalternos, - França, Arábia-Saudita ou Turquia - com o encargo de
as lançar sobre a Líbia, a Síria, o Mali ou o Iémen e ainda a implantação de
multinacionais 2.0 e 4.0 pelos quatro cantos do universo. Congregando sob a sua
poupa todos os deserdados da mundialização foi de imediato catalogado com a
infamante etiqueta de “populismo”, Trump quer ao contrário quebrar o comércio-livre
e travar as operações da baixa política de “polícia” mundial. Semeando o pânico
no campo dos que aproveitando o sistema com a bendição do espirituoso Obama e a
encantadora Michelle. Mas esta histeria também tem uma causa externa tendo em
conta as novas posições para com os europeus e as Américas, potências que não
partilham esta visão do mundo. A reação terrorista é um exemplo, ela que provém
de uma região e de uma religião que se sente humilhada por um século de
ingerências desastrosas. A reação chinesa, russa, indiana a que se veio juntar
as Filipinas, precedentemente pelas da América Latina, que com manobras mais ou
menos legais tendem manter a ordem, como foi o caso na Argentina, no Uruguai,
no Brasil ou na Venezuela, entre outros.
Todos
estes países há pouco silenciosos e ausentes da sena mediática mundial,
reivindicam o seu lugar ao sol. Os seus media,
contrariamente aos nossos, encontram-se em pleno desenvolvimento. TV, rádio,
jornais e media numérico estão em
constante progressão e dão lucro. Abrem escritórios de correspondentes em todo
o mundo e lançam canais de info em
cadeia, não aceitando servir de relay
à vulgata mundial da CNN ou BBC, querendo pelo contrário compartilhar a sua
própria visão do mundo, intolerável para os dirigentes políticos e os caciques dos
nossos grandes media, habituados a
que se beba o seu palavreado sem gaguejar.
Pior,
esses media são contestados no seu
próprio terreno pelos seus leitores e auditores, que perderam toda a confiança,
depois que tomaram posições contrárias à sua própria deontologia e falhando
calamitosamente quanto ao Brexit, Trump, Fillon e na capacidade do povo sírio
de resistir ao terrorismo islâmico.
O
storytelling do bom democrata
respeitoso dos direitos do homem e comprometido com a liberdade de expressão,
não aceita os que saem dos círculos estreitos do poder europeu e
norte-americano. O New York Times, o Washington Post, a BBC, Le Monde e seus associados já não marcam o passo. Ter de se
inclinar face aos sucessos de audiência da Rússia Today, é a vergonha suprema,
a afronta final, e que o Parlamento Europeu quis lavar adotando uma resolução
que restabelecia a censura na Europa!
Para
o establishment de Washington,
habituado a dominar o planeta desde há vinte anos, compreende-se que a pírula
seja amarga.
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